3. Início da jornada
Tentava me levantar. Enfim consegui. Depois de passar uma manhã inteira tentando, finalmente conseguira. Mas, eu não agüentaria dar mais nenhum passo. Meus músculos estremeciam à menor menção de movimento. A sensação era de que a morte me rondava, e isso só aumentava a fadiga. A cor do rio já estava voltando ao normal e eu, fazendo uma concha com as mãos, peguei água e bebi várias vezes. A água estava amarga. Às vezes sentia a fuligem roçando minha garganta. Sentei-me na borda do córrego. Ainda não sabia para qual direção deveria andar. Lembrei-me das montanhas, que se erguiam imponentes além do horizonte. Nelas ficavam pequenos vilarejos, e em um deles, como minha avó costumava contar, moravam alguns parentes nossos. Eram pastores de cabras que abasteciam de leite a região. Para minha sorte, esse vilarejo ficava no sopé da montanha, assim não teria que subi-la. Mas eu ainda não sabia que direção tomar. Só o que eu sabia era que as montanhas ficavam muito distantes dali, e eu não sabia em que direção ficava.
Então, como um estalo, uma idéia me surgiu na cabeça: eu seguiria o córrego em que eu estava até sua nascente, que provavelmente era nas montanhas e seguiria também o sol nascente, que apontava mais ou menos para a mesma direção. Eu pensara nisso pois minha avó dizia que o sol nascia lá sempre primeiro, e eu sabia que normalmente os córregos vem de montanhas, e como esse era gelado, só servia para aumentar a certeza.
Comecei a andar. Seria uma jornada árdua. Eu nunca nem me imaginara fazendo uma caminhada tão longa. As montanhas se encontravam infinitamente longe, e eu, no estado em que estava, demoraria séculos para chegar até elas. Com certeza ninguém me acharia por aqui, pois não devia ter sobrado ninguém depois da bomba.
Meus pés ardiam a cada passo, resultado da corrida que eu fizera ontem para fugir da bomba. E isso havia arrancado o resto de pele que eu tinha nos pés. Parei para olhá-los: estavam na carne-viva. Soltei um suspiro de angustia quando vi o estado dos meus pés. Em algumas partes o tecido estava necrosando. Eu sabia que não podia continuar com aquilo por muito tempo, senão a necrose se espalharia pelo meu corpo.
Fui seguindo o rio, andar doía e esgotava minhas ultimas reservas de energia. Já passava do meio dia e o sol estava no seu ápice. O calor vinha aumentando nas ultimas horas. O lugar quase virara um deserto, pois era só terra, areia e um pouco de vegetação aqui e ali, com algumas arvores retorcidas espalhadas pelo campo. Tudo isso era cortado por um córrego que, solitário, tentava dar vida ao local.
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